Artigo

Rescisão antecipada do contrato de compra e venda por parte do comprador

Consumidor
No items found.

Ultimamente muitas pessoas têm adquirido imóveis com pagamento por meio de financiamento bancário com duração de muitos anos. Ocorre que, diante da crise econômica que o Brasil está enfrentando, muitos compradores sofreram redução nas suas rendas e consequentemente passaram a ficar inadimplentes com o pagamento das suas obrigações, dentre elas o pagamento do imóvel próprio almejado.

Além disso, ainda existem situações em que a parte compradora não é contemplada como financiamento bancário, mesmo após o pagamento do valor de entrada, como também pode ser chamado de sinal ou arras.

O problema é que, na maioria das vezes, nos contratos firmados com as construtoras, estas impõem cláusulas de retenção do valor pago em caso de desistência, seja em um valor parcial ou até mesmo integral, o que desmotiva aparte compradora desistir do negócio e acaba no prejuízo.

No entanto, muitas cláusulas de retenção por desistência se configuram extremamente abusivas e, por conta disso devem ser consideradas nulas, melhorando as condições ou até mesmo possibilitando a devolução dos valores pagos ao comprador.

Isso porque, com diversas cláusulas de retenção da maior parte do valor pago ou até mesmo integral desequilibra a relação contratual, colocando a construtora emmelhor posição e o comprador em desvantagem excessiva, o que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor, veja-se:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:
(...)
IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade;
(...)

Dessa forma, quando a rescisão contratual ocorre por culpa exclusiva do vendedor, este deverá restituir os valores pagos deforma integral. Enquanto a rescisão ocorrer por culpa exclusiva do comprador deverá ser restituído dos valores pagos de forma parcial. É o entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça:

Súmula 543. Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador -integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.

Entretanto, o comprador, em caso de a rescisão ser por sua culpa exclusiva, poderá ficar em dúvidas em saber qual seria a retenção justa pelo vendedor, ou seja, qual parâmetro utilizado. Por isso, os Tribunais auxiliam neste quesito, o Superior Tribunal de Justiça entende que cada caso deve ser analisado, contudo, possui entendimento consolidado que o percentual de retenção entre 10% (dez por cento) e 25% (vinte e cinco por cento) é suficiente, conforme julgado recente:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DERESCISÃO CONTRATUAL CUMULADA COM RESTITUIÇÃO DE VALORES. RESCISÃO. INICIATIVADO COMPRADOR. PERCENTUAL DE RETENÇÃO ENTRE 10% E 25% DAS PRESTAÇÕES PAGAS.JUROS DE MORA. TRANSITO EM JULGADO. TEMA 1002/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. TERMOINICIAL. DESEMBOLSO. 1. Ação de rescisão contratual cumulada com restituição de valores. 2. Nas hipóteses de rescisão de contrato de promessa de compra e venda de imóvel por iniciativa do comprador, é admitida a flutuação do percentual da retenção pelo vendedor entre 10% e 25% do total da quantia paga. 3. A jurisprudência do STJ é no sentido de que os juros de mora incidem a partir do trânsito em julgado da decisão quando é pleiteada a resolução do contrato por iniciativa do promitente comprador de forma diversa da cláusula penal. Tema 1.002/STJ. 4.Em caso de rescisão de contrato de compra e venda de imóvel, a correção monetária das parcelas pagas, para efeito de restituição, incide a partir de cada desembolso. 5. Agravo interno não provido. (AgInt no AREsp 1674588/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/08/2020, DJe27/08/2020)

O Tribunal de São Paulo segue o entendimento do STJ, contudo, costuma julgar que20% (vinte por cento) de retenção pelo vendedor é suficiente, vejamos:

APELAÇÃO – AÇÃO DERESCISÃO CONTRATUAL C.C. DEVOLUÇÃO DE VALORES – COMPROMISSO DE COMPRA E VENDADE IMÓVEL – DESISTÊNCIA DA AUTORA – PERCENTUAL DEVIDO – ARRAS - LEI Nº13.786/2018 – JUROS – TERMO INICIAL - I – Sentença de procedência – Recurso da ré – II - Relação de consumo caracterizada – Partes que firmaram compromisso de compra e venda - Rescisão contratual em decorrência da desistência da autora –Possibilidade – Inteligência das Súmulas nºs 1, 2 e 3 deste E. TJ, bem como da Súmula nº 543 do C. STJ – Diante das peculiaridades do caso concreto, revela-se adequada a condenação da ré à devolução de 80% dos valores pagos – Observância dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade – Indenização apta a indenizar a ré pelas despesas de administração e desfazimento do negócio, bem como os gastos administrativos e publicitários, até que obtenha êxito na recomercialização do bem – Cláusula contratual que fixa percentual diverso que se revela abusiva – Cláusula contratual declarada nula – Inteligência do art.51, inciso IV, do CDC - Precedentes – III – Pagamento do sinal/arras que constitui parte do preço - Impossibilidade de sua retenção integral - Valor que integra o montante a ser restituído à autora – Precedentes - IV -Impossibilidade de incidência da Lei nº 13.786/2018 – Legislação que não se aplica aos contratos firmados antes da sua vigência - Precedentes – V - Juros de mora que devem incidir apenas após o trânsito em julgado da condenação, tendo em vista que a rescisão contratual deu-se por culpa da autora, inexistindo inadimplemento da ré – Precedentes - Ação procedente – Sentença parcialmente reformada - VI - Em razão do trabalho adicional realizado em grau de recurso, majora-se os honorários advocatícios para 15% sobre o valor atualizado da condenação, com base no art. 85, §11, do NCPC – Apelo parcialmente provido".  (TJSP;  Apelação Cível 1020536-17.2020.8.26.0001;Relator (a): Salles Vieira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional I - Santana - 9ª Vara Cível; Data do Julgamento: 20/04/2022; Data de Registro: 20/04/2022)

Evidentemente que cada caso possuirá suas peculiaridades diversas dos outros, haja vista a diversidade das previsões contratuais. No entanto, com as informações aqui expostas o comprador ficará mais seguro em pleitear pela rescisão contratual, independente do motivo e de previsão de eventual cláusula abusiva no contrato.

Por conta disso, é sempre importante a análise contratual por um especialista antes da assinatura, bem como essencial na eventual rescisão, sob pena de sofrer prejuízos injusto se desnecessários.

Artigos Relacionados

Continue lendo